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Tecnológicas, mas não mecânicas

Relação entre a presença massiva de tecnologia nos processos corporativos e a necessidade de posicionamentos mais humanos movem as marcas no rumo da inovação e são um dos temas de destaque do Web Summit


3 de novembro de 2019 - 20h00

Formas de equilibrar tecnologia e humanização são uma das principais frentes de discussão na edição 2019 do Web Summit (Crédito: Eóin Noonan/Web Summit via Sportsfile)

Por Isabella Lessa ilessa@grupomm.com.br e Roseani Rocha rrocha@grupomm.com.br

Embora embarcar tecnologias e inovação a processos, serviços e, principalmente, produtos seja uma busca frenética, as empresas se preocupam em fazê-lo de maneira a não tornar frias e mecanizadas suas marcas e a relação com os consumidores, cujas demandas por experiências personalizadas só cresce. As pessoas podem até ser entusiastas da tecnologia, mas no fundo querem sentir humanização nos produtos e serviços que escolhem. Diferentes aspectos desse assunto e formas de equilibrar as duas demandas constituirão uma das principais frentes de discussão na edição 2019 do Web Summit, evento que acontece de 4 a 7 de novembro em Lisboa, Portugal – este ano, com cobertura especial de Meio & Mensagem.

Managing partner da Dezon Creative & Prospective, consultoria de tendências de comportamento e representante no Brasil da Peclers Paris, Iza Dezon avalia que, comparado ao mercado internacional, a economia brasileira passa por um momento de autodefesa e sobrevivência. Mas, para ela, do ponto de vista de inovação, o País sempre teve o que agregar. Já no de adoção de tecnologias em si o faz muitas vezes sem entender muito bem o que se espera delas. “Inovação, às vezes, é uma coisa muito básica e humana, que está nas sutilezas do dia a dia, em como prestar melhores serviços, olhar para as pessoas, usar o que já tem para virar o jogo e não achar que algo novo vá resolver qualquer coisa”, analisa.

Por outro lado, a consultora discorda de quem vê a tecnologia como inimiga. Não se pode falar somente dos empregos perdidos, sem comentar das novas profissões criadas, diz, ressaltando também que os seres humanos não foram criados para funções repetitivas. E são estas as que tendem a ser eliminadas num processo em curso no qual a tecnologia é uma camada para simplificar a nossa vida.

Essa visão é compartilhada por empresas como P&G, Vivo e Samsung – somente a fabricante de eletroeletrônicos afirma ter investido globalmente US$ 14 bilhões em pesquisa e desenvolvimento, no ano passado. Loredana Sarcinella, diretora sênior de marketing da divisão de dispositivos da Samsung, as tecnologias que permitem o avanço dos produtos da marca e, por outro lado, melhoram serviços e processos internos são dois lados de uma mesma moeda. “No fim do dia, há apenas uma mesma motivação: a preocupação incessante em entregar a melhor experiência possível e a mais relevante para nossos consumidores”, afirma.

A executiva cita como exemplo de serviços positivamente influenciados pela tecnologia o atendimento remoto da Samsung. Hoje, 85% das demandas de consumidores na América Latina são resolvidas remotamente, com índice de satisfação, diz ela, na faixa dos 90 pontos, numa escala de 0 a 100.

Para a P&G, ter inaugurado em maio deste ano um Centro de Inovação no País aproxima essa área da empresa dos consumidores brasileiros e torna seus processos mais ágeis. A cientista Patricia Iturriza conta que parte dessa dinâmica agora mais acelerada ocorre graças a um “maker space”, no centro industrial localizado em Louveira (SP), em que produtos podem ser prototipados e apresentados ao consumidor, que dá o feedback rapidamente até que algo esteja pronto para ser lançado. Como Loredana, Patricia ressalta a importância de ter o consumidor como centro de atenção. “A adoção de inovação e tecnologias não pode ser uma coisa imposta, fria, mas parte do que as pessoas estão buscando. Não é ‘tecnologia porque sim,’ mas para tornar sua vida mais fácil”, pontua a cientista.

Com o intuito de oferecer não somente uma experiência melhor, mas também antecipar as demandas dos clientes e ser mais eficiente como companhia, a Vivo encara a robótica e tecnologias correlatas como grandes aliadas. Com esse raciocínio, a empresa utiliza soluções de automatização e bots para simplificar fluxos e processos internos, assim como evoluir no relacionamento com o consumidor. Internamente, a operação conta com robôs que identificam possíveis fraudes em processos jurídicos e outros dedicados a ajudar no processo de recrutamento e seleção, “lendo” diversos currículos e gerando um ranking dos melhores candidatos. Em fevereiro do ano passado, a marca lançou a ferramenta de inteligência artificial Aura. Com tom e linguagem próprias, a solução foi desenvolvida para ser capaz de responder de forma personalizada a questionamentos sobre consumo de dados, 2ª via de conta, recarga, entre outras dúvidas relacionadas aos serviços contratados pelo cliente. Segundo Marina Daineze, diretora de imagem e comunicação da Vivo, Aura faz mais de 20 milhões de atendimentos por mês e, desde que foi lançada, já teve mais de 90 milhões de interações com clientes da Vivo, com nível de precisão de aproximadamente 90%. Para ela, a inovação é um componente importante para oferecer uma experiência personalizada. “Garantir esse nível de precisão é um trabalho constante e que teve um grande impulso com a criação do Centro de Treinamento de Bots, em agosto do ano passado”, comenta ela.

Vivo levou para publicidade discussão sobre efeitos da hiperconexão e uso consciente da tecnologia (Crédito: Reprodução)

Mais aplicação, menos criação

Tiago Ávila, venture capitalist no hub de inovação e aceleração Distrito, afirma que o Brasil pode ser considerado um mercado relevante para qualquer coisa, baseado puramente em escala e importância econômica. Mas nota que as soluções brasileiras de sucesso têm sido mais destaque na aplicação de uma tecnologia do que na sua produção de fato. Isso faz com que, de modo geral, não haja fortes investimentos em P&D pelo setor privado. “Investidores têm percebido que encontrar uma startup com modelo de negócios sólido utilizando uma tecnologia comprovada dá mais certo por aqui do que apostar no desenvolvimento de soluções completamente inéditas”, diz.

De toda forma, a inovação, para ele, começa em processos, em especial, no “arriscado mercado de startups”. Para ele, a melhor maneira de detectar o que – em termos de inovação e tecnologia – veio para ficar e faz sentido nas atuais demandas dos consumidores é entender qual problema está sendo resolvido ali. Se o problema é importante e a solução o resolve, não importa o quão na moda esteja a tecnologia por trás. “A tecnologia em si não é solução para nada. É a aplicação dela para resolver um problema real que vai definir seu sucesso ou fracasso”, defende Ávila.

Loredana, da Samsung, destaca que um passo anterior à inovação é entender o público-alvo, suas visões e desejos, consequentemente, aquilo que faz sentido em seu dia a dia e será transformado em novos produtos e serviços e na estratégia de comunicação mais adequada para traduzi-los. Para o lançamento do Galaxy Note 10, por exemplo, afirma que a companhia fez estudos sobre os hábitos de trabalhadores de 25 a 44 anos. Ao detectar diferença de visões em relação a gerações anteriores, a definiu como “New work tribe”. Assumindo que as pessoas desempenham papeis múltiplos – como aliar uma carreira a um hobby, e considerando suas manifestações em redes sociais –, o produto foi desenvolvido para aliar criação de conteúdo com ferramentas de trabalho.

Já sobre o papel que os smartphones terão numa sociedade que vive o movimento de ascensão de casas conectadas e assistentes de voz, a diretora de marketing da Samsung considera que além de forma rápida e fácil de comunicação com o mundo, os aparelhos serão os hubs para múltiplas tarefas, num ecossistema de produtos que conversam entre si. “É uma verdadeira revolução e os smartphones estão no centro dessa mudança de hábitos de consumo”, diz.

Também de olho nessas mudanças, principalmente no que elas poderão influenciar os hábitos de compra, a P&G não dá muitos detalhes, mas Patricia Iturriza garante que o assunto está sendo tratado à altura de sua relevância. “Estamos analisando como o assunto evolui, se será rapidamente que as pessoas vão deixar de comprar no mercado e pedir produtos via assistente de voz”, pondera. Ela acrescenta que as equipes do Centro de Inovação no Brasil estão bastante conectadas com os times norte-americanos, onde esses processos já estão mais adiantados.

Interações tecno-humana

Por mais contraditório que possa parecer, como ressalta Iza Dezon, foi o avanço das tecnologias digitais que permitiram e continuam a permitir uma interação mais personalizada entre marcas e consumidores, ou a personalização em massa, o que em última instância traz o sentimento de uma relação “humanizada”.

Da parte do consumidor, há cobranças crescentes para que as marcas também se comportam como uma persona humana, não apenas tendo propósitos claros como também se manifestando sobre assuntos polêmicos ou abraçando diferentes tipos de causas. Iza, no entanto, defende que as marcas comecem a usar uma “compaixão mais racional”, para entender o que, de fato, faz sentido e agrega valor, tanto para o consumidor, quanto para os planos de mais longo prazo.

Centro de Inovação da P&G no interior paulista: tecnologias não pode ser uma coisa imposta (Crédito: Divulgação)

“Temos que olhar as duas coisas. É parte da nossa história evoluir com as tecnologias mais modernas, mas estar em dia com as necessidades e demandas das pessoas para fazer isso de forma mais humanizada”, avalia Patricia, da P&G. Nesse movimento, Loredana, da Samsung, reconhece que às vezes o maior desafio é não perder de vista que se trabalha com e para pessoas, a despeito da velocidade do desenvolvimento das tecnologias e do quanto isso muda as formas de interação. Para os profissionais de marketing, que representa, ela lembra que cabe estar atentos às mudanças, porque só lidando com pessoas em vez de tecnologias é que é possível transmitir verdade nos contatos com os consumidores.

Como uma marca que oferece serviço de conexão à internet, a Vivo já se posiciona em sua comunicação sobre a relação das pessoas com a tecnologia. “O propósito da marca Vivo é conectar pessoas e sabemos que a conexão traz um mundo de possibilidades, por isso iniciamos, há alguns anos, um movimento para entender como a tecnologia tem impactado a vida das pessoas e como ela pode ser um fio condutor que cria conexões, sem substituir o contato pessoal”, afirma Marina. Ela conta que a empresa já vinha acompanhado discussões sobre hiperconexão e entendeu que havia a necessidade de reflexão sobre o tema do uso consciente da conexão e da tecnologia. Com isso em mente, a empresa resolveu apostar em uma abordagem que caracteriza como leve e responsável, materializada na assinatura #Temhorapratudo. A campanha convida os consumidores a refletirem sobre o tema e a repensarem a relação com a tecnologia. “Com ela, trazemos a nossa crença de que cada conexão, seja ela tecnológica ou não, tem a sua hora e deve ser vivida por inteiro. Na campanha, a Vivo reafirma algo em que sempre acreditou: a conexão deve aproximar as pessoas, não afastá-las”, diz a executiva.

Sobre eventuais dificuldades em deixar no mesmo ritmo a evolução tecnológica e a evolução social e humana das empresas, Loredana não vê problemas. “Pelo contrário, é por meio da evolução tecnológica que possibilitamos que as pessoas façam o que não era possível antes. Nosso posicionamento, ‘Do What You Can’t,’ reflete o equilíbrio fino que temos de inovação em nosso DNA, entendendo que a tecnologia ajuda a transformar a vida das pessoas para melhor”, enfatiza.

Para a executiva da Samsung, os altos índices de lembrança de marca conquistados nos últimos anos aconteceram justamente pelo fato de a companhia ter conseguido aliar evolução tecnológica e a adoção sincera de valores que traduzem suas crenças. Para uma companhia global, mesmo o desenvolvimento tecnológico pode dizer respeito à forma como se encara determinado mercado. Nesse sentido, Loredana acredita, também, que ter duas fábricas no Brasil (Manaus e Campinas) e três centros de pesquisa e desenvolvimento (dois em Campinas e um em Manaus) são cruciais para a presença distinta que a empresa conseguiu estabelecer no mercado local.

A Vivo, por sua vez, resolveu aplicar a tecnologia a outro segmento com o intuito de minimizar emissões de gás carbônico: em setembro, a companhia lançou um projeto piloto com três carros elétricos com autonomia de 300 quilômetros e que devem circular inicialmente na grande São Paulo. A expectativa é de que o projeto seja expandido para outras unidades da empresa a partir de 2020. Os carros são recarregados em eletropostos disponíveis por meio de uma parceria com a AES Tietê, companhia de geração de energia e plataforma integrada de soluções energéticas sustentáveis. Apenas com a implementação destes três veículos elétricos, a marca afirma que deixará de emitir quatro toneladas de CO2 por ano.

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